É na paixão por Davi que a atriz Carolina Dieckmann se revela mais
intensa e mais centrada. Numa conversa franca, ela conta como busca
inspiração na própria infância para criar seu filho.
A briga começou na hora do jantar. Carolina Dieckmann, linha-dura,
insistia em que era preciso comer a verdura. Davi, 7 anos recém-feitos,
tentava enrolar a mãe. Carolina foi se exaltando, o menino também, até
que ele saiu com esta: "Calma, mãe, você já entrou na personagem?" A
personagem em questão é Leona, a vilã da novela COBRAS E LAGARTOS,
de João Emanuel Carneiro, que estreou no mês passado no horário das 7.
Na época do bate-boca, as gravações mal tinham começado, mas Davi já
sabia que a mãe faria papel de malvada e usou a informação a seu favor.
Perplexa com o desafio (e ao mesmo tempo orgulhosa do raciocínio rápido
do garoto), Carolina demorou alguns segundos para dar uma resposta à
altura: "Por acaso seu pai ficou cego para viver o Jatobá?" Para quem
não se recorda, o pai de Davi, Marcos Frota, interpretava um cego na
novela AMÉRICA, que foi ao ar em 2005. Davi reconheceu que não, e a refeição prosseguiu sem mais turbulências.
Aos
20 anos, quando a maioria de nós ainda se vê enredada no papel de filha
- pedindo colo e conselhos -, Carolina Dieckmann abraçou a maternidade e
enfrentou uma transição bem mais delicada do que a exigida para
encarnar uma personagem na TV. Ao dar à luz, a filha da pedagoga Maira,
54 anos, e do engenheiro naval Roberto Dieckmann, 55, imbuiu-se das
responsabilidades de mãe. Não que acumular responsabilidades fosse
novidade para ela: Carol começou na carreira cedo, na minissérie global SEX APPEAL,
em 1993. Tinha apenas 14 anos e horários de gravação de gente grande.
Aos 18, casou-se com o ator e artista circense Marcos Frota, 23 anos
mais velho. Aos 19, perdeu um bebê. Meses depois, engravidou de novo e
teve Davi. Separou-se de Frota em 2003 e, hoje, com 27 anos, já é uma
das atrizes mais queridas do público graças a papéis como o de Camila, a
jovem que lutou contra a leucemia na novela LAÇOS DE FAMÍLIA
(2000). Se tudo aconteceu tão precocemente, não é de estranhar a garra
com que Carolina encarou o rojão de educar um filho. "Ser mãe muda
tudo", observa. "Educar é muito difícil, mas minha mãe foi um grande
modelo. Sempre quis ser para o Davi o que ela significou para mim."
Maira foi uma mãe do seu tempo, equilibrando carreira, filhos, casamento
e, quando possível, algum tempo para si mesma. Dava aulas na mesma
escola em que as crianças estudavam, mas procurava não se meter nas
diferenças entre elas e seus professores. "Criei meus filhos para o
mundo", afirma. "Dei a eles uma boa formação e sempre confiei em que
nada de muito errado iria acontecer." Quando Carolina e os irmãos -
Bernardo, hoje com 30 anos, e os gêmeos Edgar e Frederico, 25 -
cresceram um pouco, foi trabalhar numa empresa de turismo. Viajava dez,
doze vezes por ano. "Minha mãe trabalhava mais do que eu. Não me lembro
dela pondo a gente na cama, fazendo carinho, cumprindo rituais. Mesmo
assim, transformou nossa casa num lugar acolhedor. Trazia os filhos para
perto sem obrigá-los a vir, apenas proporcionando um ambiente seguro,
confortável, onde ninguém era julgado e todo mundo se sentia estimulado a
tomar decisões. Era como se tivéssemos uma rede psicológica sob nós",
lembra. "Isso fez de mim uma criança muito segura. Estou plantando a
mesma sementinha no Davi e vejo que dá certo: ele é seguro e assertivo
como eu."Então, que Carol esteja preparada - ela aprontava e não raro
colocava a mãe em situações que, de tão embaraçosas, chegavam a ser
divertidas. Ainda não tinha 10 anos quando cismou que queria uma roupa
de grife. Maira argumentou que, se comprasse para ela, teria que
presentear também os outros filhos, o que sairia muito caro. Carolina
ligou para o escritório e pediu para falar com o chefe dela: "Você pode
dar um aumento para a minha mãe? É que eu quero uma roupa e ela diz que
não tem dinheiro para comprar". Por sorte, o chefe levou na esportiva.
Carol, claro, tomou uma bronca. "Se fosse outra pessoa, poderia pensar
que eu tinha orientado Carolina a fazer aquilo", recorda a mãe.
As broncas de Maira eram, na verdade, longas conversas, recheadas de
bons argumentos. "Ela nunca levantou a mão contra nós. Meu pai era mais
bravo. Era ele quem nos dava chineladas. Minha mãe equilibrava a
família", conta Carol. Certa vez, a menina e os irmãos gêmeos brincavam
sem permissão com uma câmera fotográfica do pai. A máquina caiu no chão e
se partiu em três pedaços. Carolina grudou as partes com cola. Quando o
engenheiro se deu conta da arte, exigiu que o culpado se entregasse.
Unidos por um pacto de lealdade, ninguém acusou Carol - de cujas mãos a
câmera havia caído. Enfileirados na cama, apanharam os três, cúmplices.
"Eu me lembro das punições e elas me fizeram bem. Nunca mais pegamos
nada escondido", sentencia ela. Talvez por isso Carolina não se acanhe
em afirmar que, quando acha necessário, dá palmadas no filho, sempre no
bumbum. "O Marcos é o bonzinho na educação do Davi e eu me preocupo em
pôr limites." Ela se policia para não agir por impulso. "A agressividade
muda o sentido da palmada, que é apenas um 'se liga'. Me criticam
quando digo que ajo assim, mas pesquisas mostram que faz bem. Acredito
nelas." Maira não aprova, mas também não interfere. "Acho que a agressão
causa medo. Eu era mediadora, mas nunca me portei com frouxidão. A
Carolina é meio Hitler com o Davi."
Dito assim, pode parecer que
Davi é terrível. Injustiça pura, segundo a atriz. As tão decantadas
chineladas ocorrem duas vezes por ano, quando muito. No ano passado, ao
folhear o boletim do filho, que cursa a sisuda Escola Britânica, no Rio,
Carolina descobriu que o garoto é considerado uma criança "reservada e
feliz". "E ele é isso mesmo!", comenta, entusiasmada. "Davi é
organizado, brincalhão e generoso." Escaldado desde a briga da mãe com a
equipe do programa PÂNICO NA TV - que queria que Carol
calçasse as "sandálias da humildade" -, Davi hesitou em fazer a foto
para a capa de CLAUDIA. Foi convencido por ela, mas, na hora H, já no
estúdio, mudou de idéia: queria ir para casa, foto nem pensar. Carol
pediu um tempo para falar com o menino. Fechados no camarim, conversaram
durante 15 minutos sobre a importância de manter a palavra empenhada.
Davi saiu sério, compenetrado de que tinha um dever - e acabou se
divertindo com a nossa equipe.
O menino tinha 4 anos quando o
casamento dos pais acabou. Até a Pedra da Gávea sabe que Carolina
Dieckmann e Marcos Frota se separaram porque ela cansou da solidão -
Marcos vivia viajando com a trupe do Grande Circo Popular do Brasil. "O
Davi percebeu que eu ficava muito sozinha, nunca escondemos isso dele.
Mas jamais nos surpreendeu brigando." Uma experiência bem diferente da
que Carol viveu na infância: ainda criança, viu os pais se separarem,
mas continuarem morando na mesma casa. "Minha mãe achava que assim a
gente sofreria menos. Foi um erro. Teria sido melhor para todo mundo se
ela tivesse escolhido ser feliz." A convivência forçada dos pais
perdurou por cerca de dez anos e marcou Carolina. "Eu fiz com a melhor
das intenções, mas talvez minha filha tenha razão", reconhece Maira.
Quando decidiu encerrar a relação com Marcos Frota, Carolina não
pestanejou. Logo depois, reencontrou uma paixão platônica da
adolescência, o hoje diretor de TV Tiago Worcman, 30 anos. Os dois vivem
juntos num condomínio em São Conrado, no Rio, e pretendem oficializar a
união em breve. Se depender de Davi, o passo seguinte é providenciar um
irmãozinho, cujo nome ele já escolheu: Moisés. "O Davi está pronto para
ter um irmão", diverte-se Carolina. Se ter irmão é sinônimo de
partilhar, está mesmo. Toda vez que ganha um brinquedo, o garoto é
convidado a doar um usado para uma criança pobre. Carol quer que ele
nunca perca de vista quanto é privilegiado por ter pais que o amam,
roupas transadas, uma casa confortável. Certa vez, ela sugeriu ao filho
que doasse um Peter Pan sem uma das pernas. "Mãe, eu acho que uma
criança pobre não gostaria de ganhar um Peter Pan sem perna", argumentou
o menino. O respeito ao outro sempre foi moeda forte na casa da família
Dieckmann e, nesse ponto, Carolina segue à risca a cartilha da mãe.
"Ela até cobra mais do que eu", diz a avó. Para Carol, ser boa mãe é
isto: mostrar caminhos, botar limites e investir na qualidade nas horas
em que estão juntos - mesmo que sejam poucas, como nesses meses de
gravação de novela. "Hoje é difícil achar tempo, mas os momentos que
passamos juntos vão ficar gravados para sempre na minha memória e na
dele."
Texto retirado da revista Claudia.